ENTREVISTA COM ROD GONSALES
DESILUDIDO PELAS EDITORAS DE QUADRINHOS, ELE ACHOU SEU PÚBLICO NOS SINAIS DE TRÂNSITO.
Você foi um dos mentores da Central de Quadrinhos Brasileiros. O que te levou a cria-la? Conseguiu alcançar os seus propósitos com ela?
Minha vontade de trabalhar me fez querer participar do movimento CQB.
Ele pretendia abrir as portas pro mercado de HQs através de leis de proteção para os artistas.
Essas leis iam garantir que as editoras reservassem uma porcentagem de suas publicações para obras nacionais.
Mobilizamos até alguns deputados que chegaram a elaborar a nossa proposta no congresso, não só para revistas, também pros desenhos-animados (Simplício Mato e Vicentinho).
Não foi aprovada, mas de certa forma a CQB deu certo, divulgamos bastante a HQ nacional, fiquei amigo dos maiores mestres e consegui até mesmo alguns trabalhos.
Quais mestres são estes e que trabalhos abriram pra você por conta da CQB?
Gedeone Malagola, Eugenio Colonnese, Claudio Seto, Bartolomeu Vaz, Rodolfo Zalla, Emir Ribeiro, Fernando Ikoma, Edmundo Rodrigues, Wilson Fernandes, Shimamoto, Tony Fernandes, Osvaldo Talo, Franco de Rosa, Seabra, Dag Lemos, Douglas Galindo, Antônio Krisnas, José Meneses, conheci a família dos finados Minami Keizi, Oscar Kern, Júlio Lanzelotti e Ayres Campos (o Capitão 7), conheci o Carlos Miranda (o ator que fazia o Vigilante Rodoviário), nossa, foram muitos mestres, vou parar por aqui porque não quero esquecer ninguém tão importante quanto eles.
Consegui uma pá de trabalho nesse rolê, escrevi roteiro da Velta na revista Tempestade Cerebral; entrevistei mestres e novos artistas para muitos sítios de quadrinhos da internet (Bigorna, Impulso HQ, Quadrinharte, Estúdio Pégasus); publiquei o gibi do meu personagem Blenq pela editora Júpiter 2 e escrevi matérias para a revista Mundo dos Super-Heróis.
Não acha exagero dizer que muitos dos heróis norte-americanos são cópias do brasileiros?Logo, os americanos, que criaram o gênero? Vc tem algo de concreto que dê razão à esta afirmação?
Foi o Brasil que criou o quadrinho de super-herói, quem não acredita é porque é paga-pau dos gringos e não sabe valorizar a cultura nacional.A maioria dos super-heróis norte-americanos famosos são cópia de algum brasileiro, é fato, Carlão.
Deve ser plano-secreto da CIA.O que tenho de concreto são datas que já divulguei por aí. Fiz uma pesquisa a respeito desse assunto onde conheci muitas histórias sinistras que se confirmavam através de datas e divulguei os resultados. Sei muito mais do que 3 fatos de cópias e pelo menos uns 4 heróis brasileiros que vieram antes do Super-homem. Sou um patriota num país que a maioria de seu povo é alienado e age contra si mesmo, por isso que foi tudo desacreditado, e é por isso que não quero mais comentar esse assunto. Tá na hora de outra pessoa se interessar e correr atrás de mais informações, enquanto for só um homem, ou seja, eu, falando fica irrelevante.
Quando e qual foi seu 1° contato com HQ estrangeira e nacional?O que vc lê hoje?
Nacional: um gibi do Tony Fernandes, um super-herói de traço infantil chamado Supemingo; gringo: os gibis "talão-de-cheque" do Xuxá e Pequeno Sherife que meu pai tinha. Não leio muito gibi, só mesmo os da editora Júpiter 2 e da Velta.
Por quê esta predileção aos gibis da Júpiter II?
Publica gibis baratos, divertidos e sob uma ética e moral que valorizo e defendo.
Quando começou a criar seus roteiros?
Com 2 ou 3 anos. Nas primeiras HQs que desenhei era praticamente um bebê então descrevia o texto e minha vó escrevia nos balões.Parei com 9 anos e depois voltei, com 25 anos.
Como pensou no Blenq e Luã e quais suas influências?E pq estes nomes diferenciados?
Criei esses nomes na infância. Luã é porque o personagem vem da Lua e Blenq surgiu quando vi um surfista pegando onda na praia pela primeira vez. Não tem um porque, foi o nome que veio na minha cabeça na hora quando o criei. Aproveito a oportunidade para dizer que ambos têm uma origem, que ainda não foi publicada.
Muita gente acha que eles vieram do nada, mas não é bagunçado assim. Esse pessoal que reclama sem saber têm que deixarem de serem aceleradinhos.
Na edição 1, o tema foi a preservação do Bicho-Preguiça.Foi algo panfletário ou institucional mesmo?Lembro que muita gente criticou a arte da edição, preferindo o roteiro ao desenho,que acusavam de amador.
Conheci a Verinha, bióloga responsável pelo Projeto de Preservação do Bicho-Preguiça, em Ilhéus/Bahia. Ficamos amigos e essa foi a maneira que encontrei para colaborar. Eu curti a arte, meus familiares e amigos, os leitores que falaram comigo, todos curtiram muito. O Darlei e o Óqui (desenhistas das HQs publicadas na citada edição) são grandes artistas!Não faço HQ para os críticos, mas para minha família, meus amigos e os meus leitores.
Na edição 2, apareceu o Lobisomen de Sepé. Foi baseado em alguma lenda?
É verídico. Naquele ano deu nos jornais e na televisão que os moradores dessa cidade do sul do país disseram que sofreram ataques de um lobisomem.Depois conversando com as pessoas muitas me contaram histórias de aparições de lobisomem.Comigo mesmo já aconteceu uma parada sinistra.
O que aconteceu exatamente?
Uma vez no interior, eu e um amigo estávamos de férias, estávamos num sítio, dormindo em um barracão que ficava afastado da acomodação das outras pessoas.
Numa noite de lua cheia ouvimos barulho de um animal, um grande cachorro.
Ele invadiu o quarto e atacou o meu amigo, eu achei uma enxada e consegui colocar ele pra fora dando cacetada nele.Ele conseguiu machucar meu amigo, mas trancamos a porta e ficamos acordados, com medo.Ouvíamos gritos de animais, uivos.
No outro dia havia galinhas degoladas e um cachorro mortalmente ferido, além do meu amigo, que se tornou um cara traumatizado.
O que te fez pensar em usar estas lendas,como foi que vc pensou “nossa,isso pode ser muito legal numa HQ”. Seria uma forma de diferenciar do que se vê nas bancas?
No momento que escrevia o roteiro em si não filosofei nada em cima, só bateu inspiração. É algo comum em minha obra, tudo que faço é baseado na realidade que observo, vivencio ou acredito. Outro aspecto é mostrar meu conceito de nacionalismo desenvolvido sob uma visão de brasilidade moderna, pós-cosmopolita, ou seja, não nega as influências que nós brasileiros tivemos de outros povos até aqui, mas a partir de então, pretende subvertê-la para nos tornar mais importantes para nós mesmos e para o mundo do que o que somos agora.E mais prepotentes dessa importância.
Isso é essencialmente revolucionário e diferencia meu trabalho do de qualquer outro artista em atuação no Brasil, seja nos quadrinhos, seja na música. É dessa a maneira que meu trabalho se manifesta interiormente e o aceito do jeito que é na hora de expressá-lo para o mundo. Porque não pratico auto-censura; estou em guerra contra tudo que está estabelecido. Entrei numa crise existencial no começo do ano por conta disso que quase me levou ao suicídio, mas superei, chegando à conclusão que o mais importante na vida é o amor. Por pior que a sua situação esteja, saiba que existe uma solução, seja forte!
A arte aqui melhorou, sendo do veterano Rodolfo Zalla. Como se deu a proposta dele desenhar Blenq? Qual a opinião dele sobre o personagem?
Foi o maior presente que o Blenq poderia ter ser desenhado pelo grande Rodolfo Zalla, o maior mestre do quadrinho nacional em atividade. Esse foi sem dúvidas o ponto alto da minha carreira de produtor de histórias em quadrinhos. Pra minha alegria e satisfação dos leitores ele gosta muito de desenhar HQs do Blenq e vem mais por aí!
Meu contato com o Zalla começou quando o conheci na festa do Baraldão no Blackmore. Quando o vi fiquei muito emocionado e fiz questão de que alguém me apresentasse para ele. Depois o destino nos aproximou novamente quando o entrevistei pra revista Mundo dos Super-Heróis. Na ocasião o presenteei com o gibi do Blenq número 1. Ele gostou muito do personagem e me retribuiu o presente com um desenho que trazia o Blenq e também o Luã, quando comentou que fazia muito tempo não desenhava uma HQ de super-herói, uma de suas especialidades (já desenhou Raio Negro, Targo, Heróis Hanna-Barbera,Zorro,He-Man, etc).
Quando escrevi o roteiro "Lobisomem de Sepé", logo imaginei no traço do Zalla, grande mestre do terror. E ele gostou muito de voltar a desenhar HQs de super-heróis, tanto que acabamos escrevendo juntos um roteiro ainda inédito do Blenq.
Essa HQ tem um detalhe ainda mais diferenciado, a própria esposa do mestre Zalla ajudou na idéia!
Na edição 3,vc fala dos maus tratos aos animais e problemas das drogas em tribos indígenas.Resolveu falar de temas mais dentro da realidade brasileira? E agora, o desenhista é William Cabral.Fale sobre ele.
Mais uma vez são HQs baseadas em fatos que li nos jornais. O William é um forte aliado, acredito que por desenhar em estilo clássico, que lembra muito o John Buscema, vai se tornar o maior desenhista de super-heróis do país!
Logo mais a Marvel vai roubar ele de mim...rs,rs..grande talento da HQ nacional, é um jovem esforçado que ganha a vida desenhando HQs e retratos artísticos nas agitadas ruas de São Paulo. O William já fez vários cursos de desenho, até mesmo com o mestre Eugênio Colonnese. Nos esbarramos por aí e nosso gosto em comum por desenho e música (o William já foi vocalista da banda Kalíope) ajudou muito pra gente manter a amizade que, inevitável, se tornou uma parceria profissional. Temos muitos projetos de HQs juntos e vou relançar a banda Kalíope pelo selo Discos Destruição.Ele trabalha sob encomenda, em média, cobra 10 reais por páginas, mas negocia, dependendo do número de páginas. Não é chegado numa internet, seu contato são os telefones 011-33628957 e 011-82762075.
Na edição 4, Blenq e Luã, viajam para Londres onde enfrentam mais uma vez o Lobisomem de Sepé. Na HQ, aparece Zora, a mulher-lobo, uma personagem clássica do quadrinho brasileiro criada por Rodolfo Zalla nos anos 60.Fecha a edição uma galeria de capas de gibis onde Zora apareceu.Isso foi algum tipo de negociação para Rodolfo Zalla voltar a desenhar uma Hq de Blenq?
Não, foi eu que pedi autorização pro Zalla pra personagem participar da HQ.
Por quê não pediu o Escorpião?Tem mais a ver com o Blenq,ele também é vive na Amazônia..teremos um encontro dele com Blenq?
Você tem bola de cristal? Vê vultos? Ouve vozes??? (risos)
Quem será o próximo veterano à desenhar Blenq? Alguém em vista?
Sim, um grande mestre está para desenhar uma HQ do Blenq, podem aguardar!
É um mestre do faroeste e do terror!
Conte como está sendo a experiência de ter sua revista editada pela Júpiter II e como se dá esta parceria com José Salles.
A Júpiter 2 é uma parceria entre amigos e o José Salles é um grande amigo que tenho.
Quando se deu a idéia de vender a revista do Blenq em sinais de trânsito?Conte como foram as 1° semanas e como é a recepção do público, que é bem diferenciado.
Foi uma questão de necessidade e vendo o exemplo da revista Celton,feita pelo Lacarmélio, que comprou casa, carro e sustenta família assim. Realmente é um caminho, gibi vende bem no trânsito, chega até o ponto de irritar outros vendedores de sinal. Mas não saio de rua nenhuma por conta disso, porque a rua é pública e meu produto é diferenciado! O lado ruim é que não sou visto como um artista, mas como algo próximo a um indigente, mas não me importo, o importante é vender o meu gibi e que ele seja lido.
Conte 2 fatos pitorescos bons e ruins que aconteceram na ocasião
2 ruins:
1- um vacilão que fazia malabares e disse que a rua era "dele"; aí como eu me recusei a sair fora ele chamou a polícia e inventou um monte de mentira, disse que eu ameacei agredí-lo, etc. Os policiais me enquadraram, encheram o saco.
Mas não esquento a cabeça com esse ramelão porque o destino de quem é pilantra e cagueta é um só.
2- uma mulher tava vendendo amendoim torrado chegou em mim e disse pra eu sair da rua porque que era "muito esquisito" vender gibi no sinal e ela tinha medo que a polícia viesse por minha causa e levasse a mercadoria de todo mundo que tava ali vendendo. Claro que não é todo vendedor de sinal que é chatão desse jeito, tem muitos caras e minas sangue-bom que batalham o seu pão sem atrasar ninguém e na maior simpatia.
2 bons:
1- são as crianças que, vendo o gibi do Blenq, se empolgam tanto que praticamente obrigam os pais a comprá-lo! Mostra o carisma do Blenq junto das crianças, elas gostam muito e mandam até cartinhas que me emocionam.
2- os diferentes tipos de pessoas que se interessam pelo gibi, fazendo perguntas, querendo mais edições... Já tenho amizade com pessoas que compraram uma edição e depois passaram de carro de novo e pediram os outros números. É muito legal!
Qual a periodicidade e tiragem da revista?Em quanto tempo vc consegue vender tudo?Tem sido viável?
Por enquanto não tem periodicidade fixa , começou anual, depois semestral, esse ano tá praticamente quadrimestral. Não saio na rua todo dia, então não dá pra calcular. Mas é viável, me sustento praticamente assim.
Você também escreve para revista Mundo dos Super-Heróis,certo?Como se deu o convite?
O Fransergio trabalha na revista, viu meu trabalho, curtiu e falou pro Manoel, que a edita. Daí ele me chamou pra uma reunião informal num café da rua Augusta e fez o convite.Primeiramente escrevia somente sobre super-heróis nacionais. Depois também comecei a escrever matérias sobre super-heróis criados em outros países da América Latina.
Quais os projetos para o Futuro?
Continuar escrevendo o gibi do “Blenq”, continuar tocando na minha nova banda “Odiados” e produzindo bandas para o selo “Discos Destruição”.
data de nascimento e diga: quem é Rod Gonzalez?
20 de setembro de 1977. Ou seria 1979? Esqueci... já tô chegando na idade de mentir a idade. Sou uma gota d'água no deserto.